Performance ou ambiente ideal?

Aline Zimermann e Marcelo Conteçote

Certa vez fomos contatados por uma empresa: ‘Nossos colaboradores estão desmotivados… precisamos de um treinamento’. Ouvindo a demanda questionamos o porquê dessa desmotivação e a resposta foi um misto de mau momento de mercado, com liderança sem autonomia em aspectos essenciais ao negócio e programas importantes que não eram levados a cabo.

Desnecessário dizer que desestimulamos a empresa a qualquer iniciativa que envolvesse sala de aula, dado que uma rápida análise inicial ao telefone indicou que a desmotivação das pessoas era uma reação natural e saudável ao contexto que nos era narrado.

‘Que bom que as pessoas estão desmotivadas – respondemos –, pois isso é sinal de que ainda estão com energia para produzir. Se elas estivessem com o comportamento inalterado a situação seria muito pior, pois nesse contexto isso seria indiferença, o que é muito pior.’

Recorremos sempre a essa historinha para ilustrar nossa análise e positivas discussões que temos com líderes de RH a respeito das práticas da área e do desafio de não deixá-las distantes da produção real valor dentro das organizações. ‘Mas estamos focando nas pessoas!’ Sim, e esta é outra parte do desafio. Quer saber se temos problema com as pessoas e em cuidar delas? Absolutamente nenhum. O problema está na forma como isso tem sido feito.

O que temos identificado com muita consistência é o desafio de a área de RH e da liderança em não deixar que as práticas caminhem e privilegiem o ‘ideal de ser humano e de local de trabalho’, em detrimento das metas e estratégias.

 

No alt text provided for this image

Sem nos preocuparmos com a precisão temporal, primeiro veio a moda das pesquisas de clima, brindada na sequência pelos prêmios das revistas sobre as melhores empresas em gestão de pessoas e tal. Depois surgiu o ‘employee value proposition’, mais ou menos à época em que ‘engajamento’ foi alçado como substituto competente às análises de clima. Nos últimos anos, o ‘employee experience’ tem tomado a atenção de muita gente, dividindo o palco com os apelos à diversidade e a necessidade de ser ter um propósito.

Isso nos leva a lembrar de outra conversa com um cliente em que ele – em tom de crítica – lamentava a constatação que havia feito de que todas essas metodologias são como uma grande colcha de retalhos. Respondemos que, a nosso ver, elas não são uma ‘colcha de retalhos’, mas apenas ‘retalhos’, pois jamais chegaram a formar uma ‘colcha’, uma estrutura consistente sob a qual o empresário ou executivo pudesse depositar com segurança seus resultados. Esses retalhos simplesmente passeiam por muitas organizações, ao sabor dos prêmios e congressos de gente, vez ou outra figurando nos exercícios de planejamento estratégico, sendo posicionado no último capítulo ou alinhavados com as metas e estratégias de forma quase mágica: ‘mais engajamento levará a mais resultados’.

Em meio à complexidade que naturalmente se avolumou ao redor do universo da gestão nos últimos anos, os conceitos bonitos e sofisticados de ‘cultura organizacional’ encontraram seu lugar e ali foram acolhidos

Com o tempo, essa sucessão desconexa de ferramentas e metodologias acabou por tornar abstrato e invariavelmente confuso o olhar sobre um dos elementos mais concretos dentro da geração de valor de uma empresa: a gestão das pessoas. E, em meio a todos esses pedaços de solução flutuando no ar, está a liderança se perguntando: ‘o que eu faço com tudo isso? Em qual desses eu preciso colocar foco e energia para trazer mais retorno para o negócio?’

E quem foi parar em meio a essa salada de frutas? A cultura, mergulhada exatamente no mesmo caldo. ‘Cultura é essa coisa meio abstrata e subjetiva, certo? Me ajuda a entender?’ O que ocorreu foi que de forma – provavelmente – inadvertida, o mercado enviesou a interpretação e gestão da cultura pela sua dimensão psicológica e, ao monopolizar este ângulo, foi deixando à beira da estrada elementos concretos e que são cruciais à sua existência autônoma como uma das dimensões mais importantes da gestão.

Com o conceito de Culture means Performance, a Weplace atua junto aos seus clientes fazendo-os compreender que a cultura jamais foi ou é algo abstrato e imaterial.

Nosso trabalho está focado nos dois níveis da cultura:

  • Cultura Empresarial, que corresponde à estrutura de gestão do negócio e de suas operações por meio de seus diversos instrumentos: políticas, procedimentos, indicadores, alçadas, papeis e responsabilidades, composição da cadeia de valor, governança das decisões, investimentos, etc.

  • E a Cultura Organizacional, que se refere ao conjunto de percepções dos líderes e das equipes a respeito das metas, da estratégia e da atuação do time de executivos.

Na relação entre ambas, as palavras-chave são suficiência, coerência e coesão.

Os processos críticos do negócio estão suficientemente governados por instrumentos de gestão?

Esses instrumentos estão coesos entre si? Os demais instrumentos são coerentes com a estratégia? O que os líderes pensam sobre os executivos e as estratégias?

Eles de fato acreditam nela ou são seus primeiros detratores?

E as pessoas, olhando pra tudo isso, o que pensam?

Eles veem um todo integrado e coerente quando olham pra cima ou buscam suas trincheiras porque ‘nunca se sabe o que ocorrerá lá em cima então é melhor eu me proteger por aqui’?

O viés psicológico da cultura é uma perspectiva, sem sombra de dúvida, extremamente útil e positiva mas que cuja aproximação com o universo da gestão se deu de forma desordenada e por vezes sem a destreza necessária. Em meio à complexidade que naturalmente se avolumou ao redor do universo da gestão nos últimos anos, os conceitos bonitos e sofisticados de ‘cultura organizacional’ encontraram seu lugar e ali foram acolhidos e ganharam muitos adeptos. Perdeu, infelizmente, a qualidade de gestão de muitas empresas.